quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

O primeiro milagre do 'Heliocentrismo'




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Coloco essas questões a propósito da isenção de impostos para igrejas, que foi tema de reportagem de minha autoria publicada na edição de domingo da Folha de S.Paulo (quem tiver acesso à edição digital poderá conferir também a arte, que não é disponibilizada através do link). Para quem não é assinante de nada ou não está com paciência de ficar singrando hipertextos, faço um rápido resumo da matéria:

Eu, Claudio Angelo, editor de Ciência da Folha, e Rafael Garcia, repórter do jornal, decidimos abrir uma igreja. Com o auxílio técnico do departamento Jurídico da Folha e do escritório Rodrigues Barbosa, Mac Dowell de Figueiredo Gasparian Advogados, fizemo-lo. Precisamos apenas de R$ 418,42 em taxas e emolumentos e de cinco dias úteis (não consecutivos). É tudo muito simples. Não existem requisitos teológicos ou doutrinários para criar um culto religioso. Tampouco se exige número mínimo de fiéis.

Com o registro da Igreja Heliocêntrica do Sagrado EvangÉlio e seu CNPJ, pudemos abrir uma conta bancária na qual realizamos aplicações financeiras isentas de IR e IOF. Mas esses não são os únicos benefícios fiscais da empreitada. Nos termos do artigo 150 da Constituição, templos de qualquer culto são imunes a todos os impostos que incidam sobre o patrimônio, a renda ou os serviços relacionados com suas finalidades essenciais, as quais são definidas pelos próprios criadores. Ou seja, se levássemos a coisa adiante, poderíamos nos livrar de IPVA, IPTU, ISS, ITR e vários outros "Is" de bens colocados em nome da igreja.

Há também vantagens extratributárias. Os templos são livres para se organizarem como bem entenderem, o que inclui escolher seus sacerdotes. Uma vez ungidos, eles adquirem privilégios como a isenção do serviço militar obrigatório (já sagrei meus filhos Ian e David ministros religiosos) e direito a prisão especial.

A discussão pública relevante aqui é se faz ou não sentido conceder tantas regalias a grupos religiosos. Não há dúvida de que a liberdade de culto é um direito a preservar de forma veemente. Trata-se, afinal, de uma extensão da liberdade de pensamento e de expressão. Sem elas, nem ao menos podemos falar em democracia.

Em princípio, a imunidade tributária para igrejas surge como um reforço a essa liberdade religiosa. O pressuposto é o de que seria relativamente fácil para um governante esmagar com taxas o culto de que ele não gostasse.

Esse é um raciocínio que fica melhor no papel do que na realidade. É claro que o poder de tributar ilimitadamente pode destruir não apenas religiões, mas qualquer atividade. Nesse caso, cabe perguntar: por que proteger apenas as religiões e não todas as pessoas e associações? Bem, a Constituição em certa medida já o fez, quando criou mecanismos de proteção que valem para todos, como os princípios da anterioridade e da não cumulatividade ou a proibição de impostos que tenham caráter confiscatório.

Será que templos de fato precisam de proteções adicionais? Até acho que precisavam em eras já passadas, nas quais não era inverossímil que o Estado se aliasse à então religião oficial para asfixiar economicamente cultos rivais. Acredito, porém, que esse raciocínio não se aplique mais, de vez que já não existe no Brasil religião oficial e seria constitucionalmente impossível tributar um templo deixando o outro livre do gravame.

No mais, mesmo que considerássemos a imunidade tributária a igrejas essencial, em sua presente forma ela é bem imperfeita, pois as protege apenas de impostos, mas não de taxas e contribuições. Ora, até para evitar a divisão de receitas com Estados e municípios, as mais recentes investidas da União têm se materializado justamente na forma de contribuições. Minha sensação é a de que a imunidade tributária se tornou uma espécie de relíquia dispensável.

Está aí o primeiro milagre do heliocentrismo: não é todo dia que uma igreja se sacrifica dessa forma, advogando pela extinção de vantagens das quais se beneficia.

Sei que estou pregando no deserto, mas o Brasil precisaria urgentemente livrar-se de certos maus hábitos, cujas origens podem ser traçadas ao feudalismo e ao fascismo, e enfim converter-se numa República de iguais, nas quais as pessoas sejam titulares de direitos porque são cidadãs, não porque pertençam a esta ou aquela categoria profissional ou porque tenham nascido em berço esplêndido. O mesmo deve valer para associações. Até por imperativos aritméticos, sempre que se concede uma prebenda fiscal a um dado grupo, onera-se imediatamente todos os que não fazem parte daquele clube. Não é demais lembrar que o princípio da solidariedade tributária também é um dos fundamentos da República.


Hélio Schwartsman
, 44, é articulista da Folha. Bacharel em filosofia, escreve para a Folha Online às quintas.

Fonte:

http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/helioschwartsman/ult510u660688.shtml

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E você ainda se pergunta porque em cada esquina do nosso país se encontra uma igreja? Com essa facilidade, sem pagar impostos e podendo explorar a fé das pessoas, é um convite a abrir uma, não estou nenhum pouco surpreso.


Aí embaixo vai uma lista de igrejas criadas no Brasil, os seus idealizadores são bastantes criativos:

- Igreja da Água Abençoada (o "dono" dessa deve ser o Valdemiro)
- Igreja da Bênção Mundial Fogo de Poder (impactante!)
- Congregação Anti-Blasfêmias (oi?)
- Igreja Chave do Éden (faz uma cópia pra mim?)
- Igreja Evangélica de Abominação à Vida Torta (?????)
- Igreja Batista Incêndio de Bênçãos (QUEIMAAAAAA)
- Comunidade do Coração Reciclado
- Cruzada de Emoções (hã?)
- Igreja Pentecostal Jesus Nasceu em Belém (do Pará?)
- Igreja Evangélica Pentecostal Labareda de Fogo
- Igreja Evangélica Pentecostal a Última
- Embarcação Para Cristo (quem perder vai ficar!)
- Comunidade Arqueiros de Cristo (seria dos querubins?)
- Igreja Automotiva do Fogo Sagrado (Quem não tem carro não entra)
- Igreja batista a paz do senhor e anti-globo (A mais nova do Edir)
- Associação Evangélica Fiel até Debaixo D'água (que bom)
- Igreja Pentecostal do Fogo Azul (a gás?)
- Cruzada Evangélica do Pastor Qaldevino Coelho, a Sumidade (quem?)
- Igreja Filho do Varão
- Igreja da Oração Eficiente (essa é boa!)
- Igreja da Pomba Branca
- Cruzada do Poder Pleno e Misterioso (tô fora)
- Igreja do Amor Maior que Outra Força
- Igreja Dekanthalabassi (fundada pelo infeliciano)
- Igreja dos Bons Artifícios
- Igreja Cristo é Show (fundada pelo acerte acerte Soares)
- Cruzada Evangélica do Ministério de Jeová, Deus do Fogo
- Igreja das sete Trombetas do Apocalipse
- Igreja Pentecostal do Pastor Sassá (Mutema?)
- Igreja de Deus da Profecia no Brasil e América do Sul (os outros continentes que se danem)
- Igreja Caverna de Adulão (não seria do dragão?)
- Igreja Eu também Quero a Bênção
- Igreja Evangélica Florzinha de Jesus
- Igreja de Deus Assembléia dos Anciãos (de 60 anos pra cima)
- Igreja Evangélica Facho de Luz
- Igreja Evangélica Adão é o homem (E Eva a mulher certo?)
- Igreja Evangélica Batista Barranco Sagrado
- Igreja Pentecostal Jesus vem, Você Fica (pela profecia!)
- Igreja Evangélica Pentecostal Cuspe de Cristo (é mole?)
- Igreja Evangélica Subimos com Jesus (Amém)
- Igreja Pentecostal Planeta Cristo
- Igreja Evangélica dos Hinos Maravilhosos
- Igreja Evangélica Pentecostal da Bênção Ininterrupta (não para não para não)
- Igreja A Serpente De Moisés, A Que Engoliu As Outras (devia ser uma sucuri!)


É rir, pra não chorar!

Um comentário:

  1. É... facilidades, manipulação e impunidade. São pontos consideráveis para os mercenários registrar sua igreja.

    Deus tenha misericórdia de nós.

    Um abraço na paz do Senhor.

    Elian Soares
    www.evangelismoelouvor.com

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